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Centrão planta um laranjal de “vereadores federais” com o Orçamento Secreto

Se o projeto reeleitoral der certo, nem cabe indagar quanto tempo demora até que venha a próxima crise.
Imagem: Reprodução

A esculhambação definitivamente está no comando. Para onde se caminha, tudo o mais constante? Não vale perguntar àqueles que são beneficiados pela desordem promovida por Jair Bolsonaro, com o apoio da cúpula do Congresso, muito especialmente de Arthur Lira (PP-AL), presidente da Câmara. Opa! Reescrevo: Lira hoje divide a governança com Bolsonaro. Em muitos casos, manda mais do que o presidente. Ninguém, no Planalto, ousa falar sobre preço de combustíveis, ICMS, PEC da Reeleição e Orçamento sem a sua autorização. E isso inclui o presidente da República. Lira trabalha em parceria com Ciro Nogueira, vice-rei do Centrão. Se o projeto reeleitoral der certo, nem cabe indagar quanto tempo demora até que venha a próxima crise. O país será tragado por ela.

Isso a que se chama “Centrão”, com personagens que sempre se renovam, apoiou todos os governos depois da redemocratização. Mas nunca ninguém ousou lhes entregar a chave do cofre. Bolsonaro fez isso. Foi o custo para não ser chutado do Palácio. Lira e seus amigos são como a versão negativa que se tinha da divindade na Antiguidade, que Fernando Pessoa recuperou num dos poemas de “Mensagem”: “Os deuses vendem quando dão./ Compra-se a glória com desgraça”. No caso, Jair Bolsonaro está comprando com a desgraça do país o apoio que Lira e sua turma lhe venderam.

Nunca seja tolo o bastante para achar que eles não ultrapassarão determinados limites. Qualquer coisa é possível. Depois que tais emendas deixaram de ser só uma compatibilização feita pelo relator de demandas parlamentares para se constituir na fonte real dos superpoderes da cúpula do Congresso, em especial de Lira, convém deixar a esperança do lado de fora. Ou essa gente é apeada do poder ou se caminha para o pior. O país vai para o buraco, o que certamente será do agrado, do gosto e da serventia daquelas que dão suporte à súcia.

Lembram-se do tal “Orçamento Secreto”, o apelido para designar as emendas do relator? Pois bem: fingindo seguir determinação do Supremo para nominar todas as demandas, Lira e sua tropa inventaram um autor de pedidos chamado “Usuário Externo”. É um acinte. É uma nojeira. É um absurdo. E que diabo vem a ser isso? Qualquer brasileiro que se faça notar e que consiga fazer seu pedido chegar ao relator do Orçamento pode ser atendido por uma emenda, que não precisa, então, ter a marca de um deputado ou de um senador. É isso mesmo que vocês entenderam.

Segundo levantamento da Folha, dos R$ 16,5 bilhões reservados neste ano às emendas do relator, R$ 12,1 bilhões já foram negociados, assim distribuídos:
– R$ 5,6 bilhões com deputados;
– R$ 3,8 bilhões com usuários externos;
– R$ 2,6 bilhões com senadores.

Sim, senhores! Eis o modo Lira-Bolsonaro de aplicar o “Orçamento Participativo”, sempre debatido nas democracias: quem consegue furar a barreira emplaca seus pleitos — sem que o pedido traga a marca de um deputado ou de um senador. O relator teria virado, assim, uma espécie de supervereador federal.

Informa a Folha:
“Até o momento, foram beneficiados 380 deputados, 48 senadores e 1,7 mil usuários externos. O usuário externo com a maior quantidade de emendas liberadas é Carlos Guilherme Pereira Junior, que trabalha na Prefeitura de São Gonçalo (RJ). Foram R$ 120 milhões para o Fundo Municipal de Saúde da cidade. As emendas para Pereira Junior superam a verba negociada até o momento para parlamentares influentes, como o senador Fernando Bezerra (MDB-PE), ex-líder do governo e relator da PEC (proposta de emenda à Constituição) que viabiliza o aumento de benefícios sociais em ano eleitoral. Na lista dos cinco primeiros também estão Dener Bolonha, funcionário do Hospital de Amor, em Jales (SP), com R$ 66 milhões, e o governador do Amapá, Waldez Goes (PDT), com R$ 59 milhões, sendo R$ 57 milhões direto para o governo do estado e R$ 2 milhões para o Instituto de Hemoterapia e Hematologia do Estado do Amapá.”

Vá lá um governador de Estado ter os seus contatos — Goes é aliado do senador David Alcolumbre (União-AP), mas e os outros? Como é que essas pessoas conseguiram se fazer tão influentes, sem, para todos os efeitos, ter um parlamentar que leve adiante os seus pleitos? Ninguém tem essa resposta. E, muito provavelmente, não tem porque assim não aconteceu. E, como se sabe, o esforço em curso do dito Centrão busca ainda tornar impositivas, também na letra da lei, as emendas do relator. Hoje, na prática, elas são porque Lira põe a faca no pescoço de Bolsonaro e exige o pagamento. Torná-las se execução obrigatório é uma forma de tentar em emparedar um eventual adversário do presidente que chegue ao poder.

Entendam o que aconteceu, violando, de resto, a Constituição: inexistia a possibilidade de uma pessoa que não pertence à Câmara ou ao Senado apresentar uma emenda. Ainda bem, não? Isso, afinal, destrói a ideia de representação e, pois, desmoraliza a própria democracia. A menos, claro, que tivéssemos o exercício direto do poder, sem mediação. Mas, nesse caso, numa país de 220 milhões, quem se faria ouvir?

Tudo resolvido! Alguns bacanas conseguem. Voltem aos números: 31,7% do dinheiro empenhado caberiam a esses parlamentares sem mandato. Vocês acham mesmo que o Centrão, que governa o Brasil, deixaria essa dinheirama ser distribuída por aí, ao arrepio de qualquer controle político?

Ao se criar a categoria do “usuário externo” para emendas, é claro que a cúpula do Congresso debocha da decisão do Poder Judiciário e cria “laranjas” para pleitos que são dos próprios parlamentares, mas que não querem aparecer.

O buraco vai se mostrando sempre mais fundo.

“E se Bolsonaro for reeleito, Reinaldo?”

Vocês não esperam que eu diga um “que Deus tenha piedade”, né? Até porque acho que ele não teria. Sendo bom, haveria outras urgências. Não sendo, poderia se divertir a valer. Não existindo, quem liga?

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