A estiagem recorde ocorrida na bacia hidrográfica amazônica em 2023 corre sério risco de se repetir a partir do fim do terceiro trimestre e gerar novamente enormes prejuízos à economia do Estado do Amazonas e ao complexo industrial de Manaus. O alerta é do engenheiro de transportes Augusto Rocha, diretor do Centro da Indústria do Estado do Amazonas (Cieam) e da Federação das Indústrias do Estado do Amazonas (Fieam), entidades que congregam as principais empresas do Polo Industrial de Manaus (Zona Franca).
Segundo estudo do Cieam, a pior seca dos últimos 120 anos do rio Negro, que banha Manaus, resultou em um custo extraordinário de R$ 1,4 bilhão às indústrias, devido à falta de componentes e às dificuldades para escoar as suas mercadorias por via fluvial. Os prejuízos não ficaram restritos às empresas. A Prefeitura de Manaus estima que tenha havido perda de arrecadação de R$ 1 bilhão no período.
Na ocasião, a cota do rio Negro chegou ao patamar de 12,7 metros, profundidade insuficiente para o atracamento de navios de cabotagem – chegam pela costa brasileira e entram pela foz do rio Amazonas – e de longo percurso, que cumprem suas rotas para o mercado externo via Canal do Panamá. Para que as operações de transbordo de contêineres sejam executadas dentro dos padrões, a cota mínima do rio deve estar em 18 metros, levando em conta o calado dos navios e a margem de segurança exigida.
“Em março, os estudos apontam que os níveis do rio Solimões, em Tabatinga (AM), como do rio Negro, em Manaus, estão abaixo de seus níveis históricos, o que gera preocupação, embora as chuvas possam reverter este quadro. A região amazônica é extremamente complexa pelas suas dimensões. A região mais crítica é na foz do rio Madeira, na região do Tabocal, entre os municípios de Manaus e Itacoatiara, que está seriamente comprometida com acúmulo de sedimentos e necessita com urgência de serviços de dragagem”, afirma o engenheiro. No fim do ano, com recursos federais de R$ 100 milhões, foi iniciada a dragagem de um trecho de 12 km na região, mas ainda persiste um clima de ceticismo quanto aos resultados.
Ao contrário das demais regiões, o regime climático amazônico é marcado por duas estações: o inverno, período de chuvas, que vai de dezembro até junho, e o verão, que caracteriza a estiagem, nos meses de setembro, outubro e novembro. No inverno, os cargueiros que operam em Manaus chegam a carregar até 900 contêineres, volume que cai 30% no verão, em razão da recorrente baixa do nível das águas.
“No verão, os armadores instituíram a chamada ‘taxa da seca’, em função de o navio operar com uma carga menor. Mas em 2023, como não puderam atracar, a ‘taxa’ foi de 50%”, afirma Marcelo Forma, diretor financeiro da rede de lojas e farmácias Bemol, o maior grupo varejista da região amazônica, com 83 pontos no Amazonas, Acre, Rondônia e Roraima. “Nosso custo extra em fretes foi de 30%”, lamenta. Os atrasos nas entregas foram inevitáveis: “17,5% das vendas são por e-commerce. Uma entrega via fluvial para São Gabriel da Cachoeira, a 850 km de Manaus, que demorava oito dias, demorou até 25 dias”.
Para o consultor Olivier Girard, da consultoria Macroinfra, o Brasil está atrasado na solução de gargalos logísticos, que não se restringem à região amazônica. “Há entraves também na região Sul, no acesso ao porto de Itajaí (SC) durante as chuvas e no porto de São Francisco do Sul (SC), que necessita de obras de dragagem para entrada de navios de grande porte”, afirma.
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