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Tribunal Internacional foi criado com ajuda do Brasil, diz ex-ministro

O estado brasileiro é fundador do TPI", insistiu.
Imagem: ALICE VERGUEIRO/ESTADÃO CONTEÚDO

O Brasil foi um dos principais artífices da construção do Tribunal Penal Internacional e, em parte, o órgão apenas existe graças ao trabalho de diplomatas e governos como o brasileiro. Quem faz o constatação é Paulo Sérgio Pinheiro, atual chefe da Comissão de Inquérito da ONU sobre a Síria, Antes, o brasileiro atuou em alguns dos postos mais críticos da entidade, como relator para Mianmar. No Brasil, Pinheiro foi secretário de estado de Direitos Humanos no governo de Fernando Henrique Cardoso.

“Nós somos fundadores do TPI. Não assinaram os países com criminosos de guerra”, disse Pinheiro, lembrando que o Brasil está ao lado de governos como o do Canadá, França, Itália, Reino Unido, Alemanha e Japão, num conjunto de 123 estados que ratificaram o Estatuto de Roma que cria o Tribunal. “A adesão não pertence ao governo FHC. O estado brasileiro é fundador do TPI”, insistiu.

Nos últimos dias, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva causou consternação entre diplomatas brasileiros e estrangeiros, ao questionar o TPI e sugerir que poderia haver alguma reavaliação da participação do Brasil na corte. Ele ainda disse que, se o presidente russo Vladimir Putin viajasse ao Brasil, não seria preso. Há um mandado de prisão emitido contra o chefe do Kremlin por parte do TPI. Como parte do órgão, o Brasil teria a obrigação de deter o acusado.

A perspectiva de Lula, porém, é a de que há um desequilíbrio, já que americanos, russos e chineses não fazem parte do sistema legal.

Pinheiro, porém, destaca que a ausência dessas potências e a assinatura do Brasil tem uma explicação:

O Brasil entrou no TPI por não ter perpetradores de crimes de guerra em conflito internacional. Claro que temos criminosos de nossa ditadura militar. Mas nos conflitos internacionais, não temos e não teremosPaulo Sérgio Pinheiro

“Já os americanos e russos não estão lá por conta de terem perpetradores de crimes. Esse é o motivo”, insistiu.

Pinheiro conta como, de fato, o então presidente americano Bill Clinton chegou a assinar o Estatuto de Roma. Mas seu sucessor, George W. Bush, foi quem retirou os EUA da iniciativa.

“Bush não queria ver os crimes de guerra cometidos em Abu Ghraib e o circuito internacional de tortura. Os americanos mandaram prisioneiros para serem torturados na Síria”, disse. “Havia uma Internacional da Tortura, comanda pelos EUA”, afirmou.

Chantagem de Bush sobre o Brasil

Além de se retirar do TPI, o governo americano ainda começou a trabalhar pelo enfraquecimento do órgão. “Os EUA fizeram chantagem com a maior parte dos países do mundo. Alguns governos latino-americanos e de outras partes do mundo deixaram de assinar, depois de pressão da Casa Branca para que estabelecessem acordos bilaterais com os americanos. Nesses tratados, eles se comprometiam a não entregar eventuais criminosos de guerra americanos ao tribunal”, disse.

Segundo Pinheiro, a mesma pressão foi feita contra o Brasil.

Os americanos enviaram enviaram emissários para nos intimidarPaulo Sérgio Pinheiro

O governo, naquele momento, se recusou a aceitar a proposta de Washington e manteve intacto seu compromisso com o TPI.

No caso russo, um dos principais motivos para a não adesão de Moscou ao tratado foi a situação da guerra na Chechênia. O Kremlin temia ser denunciado por crimes de guerra naquele conflito. Também, no caso de Israel, a preocupação era de que um reconhecimento da jurisdição da corte levasse a casos de denúncias de crimes contra os palestinos.

Brasil: fundador e peça essencial na negociação do estatuto

Segundo o ex-ministro, a criação do TPI “se deve em parte ao engajamento brasileiro”. “O papel do Brasil foi absolutamente decisivo”, disse.

A ideia da criação de um tribunal começou a ganhar força com o fim da Guerra Fria. Em 1998, a Conferência de Roma seria o ponto final da negociação de um novo tratado para definir como crimes de guerra, crimes contra a humanidade e genocídio poderiam ser tratados.

Pinheiro lembra que, naquele momento, o governo brasileiro foi procurado pela Argentina para que, juntos, os dois países lutassem nos bastidores pela aprovação do texto que criaria o tribunal.

“Fomos contactados para dizer que Argentina estava interessava e e que queria o apoio do Brasil para a Conferência de Roma”, contou o ex-ministro.

“O presidente (FHC) se convenceu da importância e o Brasil esteve presente numa postura de liderança nas negociações, ao lado da Argentina”, lembrou Pinheiro.

“Fizemos uma dupla que fez avançar o texto do Estatuto de Roma”, insistiu, indicando que teria sido esse papel fundamental nos bastidores que também permitiu que, nos bastidores, o rápido processo de aprovação e ratificação do tratado.

“Nós, portanto, estamos ligados ao TPI desde sua fundação”, disse.

Em sua avaliação, o primeiro governo do presidente Lula, em 2003, manteve o compromisso com a corte, sem qualquer questionamento. Prova disso é que o Itamaraty manteve a candidatura de Sylvia Steiner para o cargo de juíza e fez campanha por ela.

” Quem apoiou isso foi o governo do presidente Lula e o embaixador Celso Amorim, o então chancelar”, disse. “O país teve a honra de ter uma brasileira no primeiro grupo de juízes”, constatou Pinheiro. “O Brasil entrou de total boa fé e a adesão de FHC foi prolongada pelo presidente Lula, com a campanha pela eleição de Sylvia Steiner na Assembleia Geral da ONU”, explicou.

Segundo ele, é por meio dessa participação ativa que queixas puderam ser apresentadas contra o ex-presidente Jair Bolsonaro no TPI. “O Tribunal que vai permitir o nosso criminoso local seja julgado”, defendeu.

“Portanto, pelo antes, durante e agora, nós precisamos honrar o compromisso que criamos com o estabelecimento da corte”, completou.

Prisão de Putin não é Fla x Flu

Na avaliação do ex-ministro, o verdadeiro debate que deveria estar ocorrendo no Brasil não se refere à prisão ou não de Vladimir Putin, caso ele viaje ao país para a cúpula do G20, em 2024.

“Virou um Fla x Flu sem sentido”, disse. “A preocupação do presidente Lula sobre o assunto é legítima. Esse é o debate que deve estar acontecendo entre os nosso juristas e diplomatas. Se o Brasil vai reconhecer a suspensão da imunidade de um chefe de estado ou não. O TPI diz que países devem levantar a imunidade. Mas há correntes que questionam isso”, afirmou.

“Portanto, agora, isso não é uma disputa entre o procurador do tribunal e o presidente Lula”, completou.

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