O Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) acolheu os argumentos do Ministério Público Federal (MPF) e manteve a condenação de empresas e associações pela divulgação irregular de medicamentos do chamado “tratamento precoce” contra a covid-19. O acórdão confirma a tese do MPF sobre a ilicitude do informativo “Manifesto pela Vida”, veiculado em jornais de grande circulação, que promovia o uso de remédios sem comprovação científica para o tratamento da doença, como a Ivermectina.
Na decisão unânime, a 3ª Turma do tribunal rejeitou os recursos apresentados pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), pela Vitamedic Indústria Farmacêutica, pelo Centro Educacional Alves Faria (UniALFA), pela GJA Participações e pela Associação Médicos pela Vida.
Ao publicarem o manifesto em veículos de comunicação de massa, as entidades extrapolaram o público técnico (composto por médicos e farmacêuticos) e atingiram diretamente a população em geral. Para o MPF, tal prática violou frontalmente a Lei nº 9.294/1996 e as normas da Anvisa, que vedam a propaganda indireta e impõem critérios rigorosos para a divulgação de produtos sob vigilância sanitária, justamente para evitar o estímulo à automedicação e ao uso irracional de fármacos.
O tribunal enfatizou que a promoção dessas terapias ocorreu em um cenário crítico de “infodemia”, caracterizado pelo compartilhamento massivo de informações falsas ou imprecisas que prejudicam o direito fundamental à saúde. Segundo a decisão, as instituições envolvidas tinham plena consciência do potencial danoso de suas ações para a coletividade, desviando-se de seus deveres ao promover tratamentos sem eficácia comprovada em um momento de extrema vulnerabilidade social.
Quanto à Anvisa, o acórdão reconheceu a ocorrência de omissão administrativa. O TRF4 destacou que a agência falhou em exercer seu papel fiscalizador e sancionador diante de um ilícito publicitário flagrante, distanciando-se de sua missão institucional e de sua própria regulamentação. A inércia da agência foi considerada uma falha grave na proteção da saúde pública durante a crise sanitária.
Resultado
Ao negar os recursos, o TRF4 afastou os argumentos sustentados pela defesa de “decisão-surpresa” ou violação da “paridade de armas”. Isso porque a observância da Resolução da Diretoria Colegiada (RDC) 96/2008 da Anvisa permeou toda a instrução processual, não havendo qualquer mudança inesperada no julgamento. O tribunal também não acatou a tese de suspeição do magistrado de primeiro grau, pois a participação de juízes em debates acadêmicos e a produção de estudos sobre saúde pública são práticas legítimas que visam ao aperfeiçoamento do sistema judicial, não configurando pré-julgamento ou parcialidade.
O TRF4 manteve a condenação ao pagamento de indenização por dano moral coletivo. O patamar fixado levou em conta a gravidade da repercussão social e o elevado faturamento obtido pela indústria farmacêutica no período. Os magistrados concluíram, de forma unânime, que a liberdade de opinião não autoriza a violação de normas sanitárias protetivas, restando clara a responsabilidade civil das empresas e associações diante do prejuízo causado ao bem-estar público e à ordem jurídica nacional e internacional.
ACP nº 5059442-62.2021.4.04.7100/RS
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