O período de recolhimento domiciliar noturno e em dias de folga, imposto ao acusado como medida alternativa à prisão, não deve ser contabilizado para reduzir a pena fixada pela Justiça na condenação. Essa é a tese defendida pelo procurador-geral da República, Augusto Aras, em manifestação apresentada ao Supremo Tribunal Federal (STF), nessa terça-feira (29). Na petição, ele contesta decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que, aplicando o rito dos recursos repetitivos, reconheceu a possibilidade de abater da pena final imposta o período em que o acusado permaneceu em recolhimento domiciliar noturno, no curso do processo.
O PGR pede, ainda, que o caso seja submetido ao Plenário Virtual da Corte para que se reconheça a repercussão geral da matéria. Se o STF acolher o pedido, a tese fixada após o julgamento do processo deverá ser obrigatoriamente seguida por todas as demais instâncias da Justiça em casos similares. O recurso foi encaminhado à presidente da Corte, ministra Rosa Weber.
No documento, o procurador-geral da República ressalta que a decisão do STJ feriu preceitos constitucionais, especialmente os princípios da separação dos Poderes, da igualdade, da legalidade e da individualização da pena. Além disso, para ele, ao possibilitar a redução da pena, o Tribunal contrariou jurisprudência do STF sobre a matéria, causando insegurança jurídica. Segundo Aras, em reiteradas decisões, a Suprema Corte considerou que, por falta de previsão legal, o cumprimento de medidas cautelares diversas da prisão está fora das hipóteses de diminuição da pena privativa de liberdade.
Na manifestação, o PGR sustenta a necessidade de a matéria ser apreciada pelo STF, sob a ótica das garantias constitucionais, com o objetivo de dirimir possível divergência entre os Tribunais Superiores e uniformizar a jurisprudência nacional. Isso porque o STJ – com base na análise do Código Penal e do Código de Processo Penal – e a Suprema Corte – no âmbito da interpretação constitucional – se posicionaram de forma oposta sobre a mesma questão de direito. Diante disso, para o procurador-geral, é preciso “garantir uniformidade de tratamento entre os institutos processuais penais que limitam a liberdade de locomoção e promovem o caráter ressocializador individual das penas”.
Repercussão geral – Ao defender o acolhimento do pedido, Aras destaca a relevância jurídica do caso para fins de reconhecimento da repercussão geral, pois ultrapassa o interesse das partes envolvidas na ação. Na avaliação do PGR, a decisão a ser tomada pelo STF no processo tem o potencial de afetar “todos os processos criminais em que foram impostas medidas cautelares diversas da prisão, especialmente aqueles com recolhimento domiciliar”. A medida é necessária para garantir segurança jurídica a todos os envolvidos em ações similares em trâmite no país.
Entenda o caso – O processo envolve a condenação de uma pessoa em Santa Catarina pelo crime de tráfico de drogas. Depois de aplicada a sentença, a Vara de Execuções Penais da Comarca de Florianópolis decidiu abater do tempo total da pena fixada para a condenada o período em que ela cumpriu, no curso do processo, medida cautelar diversa da prisão, como monitoramento eletrônico e recolhimento domiciliar noturno.
A cautelar de recolhimento domiciliar noturno e nos dias de folga prevê que o investigado permaneça recolhido em sua casa nesses períodos, desde que possua residência e trabalho fixos, como medida alternativa à prisão, durante o andamento do processo criminal.
O Ministério Público do Estado de Santa Catarina (MP/SC) ajuizou recurso contestando essa diminuição da pena, que acabou acolhido pela Justiça Federal. A ré, por sua vez, recorreu ao STJ, que readmitiu a detração da pena. O Tribunal entendeu que o tempo de recolhimento obrigatório noturno e nos dias de folga, por comprometer a liberdade do acusado, deve ser reconhecido como período a ser abatido da pena privativa de liberdade e da medida de segurança.
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