Após o anúncio do governo federal de mais uma troca na presidência da Petrobras, as ações da estatal operaram em queda nesta terça-feira (24) na bolsa de valores brasileira, refletindo uma cautela entre investidores devido às incertezas em torno do que poderia mudar com o quarto presidente da companhia em um ano.
A ação preferencial da companhia (PETR4) encerrou com baixa de 2,92%, cotada a R$ 31,60, após tombar mais de 4,5% ao longo do dia. Já o papel ordinário (PETR3) desvalorizou 2,85%, encerrando a R$ 34,40. Pela manhã, recuou cerca de 4%.
Não é a primeira vez que esse movimento acontece. Quando o governo do presidente Jair Bolsonaro (PL) realizou a primeira mudança na presidência em abril de 2021 demitindo Roberto Castello Branco, as ações também recuaram, mas depois apresentaram recuperação.
Para especialistas consultados pelo CNN Brasil Business, ainda é cedo para dizer se o mesmo acontecerá agora. A troca ocorre em um contexto complexo, e qualquer mudança na política de preços da empresa seria muito mal recebida pelo mercado, avaliam.
Ao mesmo tempo, apontam o fato de as ações estarem descontadas, termo usado para se referir a papéis cuja cotação na bolsa é menor do que deveria ser considerando suas características financeiras e contexto. Por isso, a estatal ainda segue atraente.
O que fazer com as ações da Petrobras?
As recomendações dos especialistas para as ações da Petrobras são diferentes dependendo do perfil de investidor.
Caso a pessoa já tenha ações da empresa, a recomendação de Flávio Conde, head de renda variável da Levante, e de Alan Gandelman, CEO da Planner Corretora, é mantê-las. “A grande maioria das corretoras coloca a Petrobras com possibilidade de ganho e altas superiores aos preços praticados, mesmo com essas questões das trocas”, destaca o CEO da Planner.
A queda na terça-feira, segundo Conde, é normal já que o mercado não gosta desse tipo de intervenção, mas é comum que elas se recuperem depois, conforme os investidores entendem o que mudará ou não na empresa, como nas trocas anteriores.
O economista avalia que os investidores darão o “benefício da dúvida” para o governo exatamente pelos casos anteriores. Mesmo com a queda, “o que conta mesmo é a cotação de quinta-feira, no primeiro dia cai, segundo sobe, a partir daí equilibra”.
“Quem tem ação e é investidor não deve vender, e as ações não estão caras, ainda é uma empresa barata, e já está incorporando o risco dos reajustes demorarem devido ao alto lucro”, avalia.
Gandelman afirma que ainda vê potencial de alta nas ações da Petrobras, e que o recuo de terça-feira foi mais um recuo pontual em um momento de susto e incerteza, com a bolsa de valores em um ambiente volátil.
“Se a queda permanecer por mais dias, a ação fica ainda mais atrativa do que está, pode ser bom momento para comprar, mas o cenário como um todo na bolsa é de volatilidade, indo de um lado e para o outro”, afirma.
Já para os que ainda não têm as ações, Conde afirma que, em geral, a Levante não recomenda comprar nenhuma ação de estatal devido à possibilidade de intervenções.
Ele diz que existem oportunidades menos arriscadas no mercado para quem tem interesse em determinados setores ou tipos de empresa.
No caso do petróleo, a 3R Petroleum e a PetroRio seriam boas opções, por serem empresas privadas e sem risco de interferência governamental.
Gandelman pondera que a PetroRio e a 3R são empresas diferentes da Petrobras, e que vale entender como elas funcionam. Em geral, são exportadoras de petróleo, e seguem os preços internacionais, o que as faz ter uma lógica diferente da Petrobras.
Se a busca por ações de estatais descontadas, Conde opina que os papéis do Banco do Brasil, com menos risco de intervenção, e da Eletrobras, prestes a ser capitalizada, são opções melhores. E se o interesse for em commodities no geral, existe a opção das metalúrgicas, caso da Vale e da Gerdau, todas privadas.
Política de preços
Para o mercado, o grande temor é a troca na presidência representar também um esforço do governo federal para mudar a política de preços da Petrobras. Entretanto, Gandelman avalia que a hipótese é pouco provável atualmente.
“A leitura é que o novo presidente é muito alinhado ao [ministro da Economia] Guedes, e não se espera que haja alguma expressiva na política de preços da Petrobras”, afirma, se referindo a Caio Mário Paes de Andrade, indicado pelo governo.
Ele ressalta porém que, se ocorrer uma mudança na política de preços, haveria uma forte influência negativa nas ações, já que estatal estaria “represando preços com custos subindo, reduzindo o lucro”.
Flávio Conde lembra que as trocas anteriores na presidência não resultaram em mudanças na política, o que é positivo, apesar de ameaças nesse sentido. “Quem aguentou o tranco durante as trocas se saiu bem, porque as ações se recuperaram”, pondera.
Entretanto, ele diz que o cenário é de incerteza, e que o governo pode acabar pressionando o novo presidente a aumentar o espaço temporal entre reajustes nos combustíveis, de 70 para 180 dias, o que não seria exatamente uma violação da política, que não define prazos de reajuste, mas ainda seguraria altas dos combustíveis e afetaria o lucro da Petrobras.
“A defasagem entre a gasolina brasileira na refinaria e a de parâmetro de mercado estava em 30% na semana passada, e quando chega em um número alto como esse, surge uma pressão para algum tipo de reajuste. O normal é uma defasagem de 10%, 15%. Isso sugeriria um aumento em torno de 10% a 15% nos próximos dias, isso que deve estar na mesa”, afirma.
Se o reajuste não ocorrer, o mercado pode ficar mais receoso com a empresa, prejudicando as ações. Ao mesmo tempo, Conde avalia que o lucro da Petrobras graças à alta dos combustíveis está tão alta que espaçar mais os reajustes não levaria a um prejuízo, só redução de lucro.
“Além disso, estamos cada vez mais na cara das eleições, e para o governo seria muito bom se de junho em diante a Petrobras não aumentasse o preço”, ressalva.
Para Gandelman, já é possível notar um espaçamento alto entre os reajustes da gasolina, já que o último ocorreu há cerca de 7 semanas e o petróleo continua alto, gerando defasagem.
Por isso, o movimento do governo “pode sim estar de fato acontecendo, mas de forma velada, ninguém vai dizer a público que mudou a política”. Ele avalia que, se o mercado notar esse movimento, que seria facilmente percebido, as ações também cairiam por representar uma interferência.
Mesmo assim, para ele o mais provável é que o governo busque outras alternativas para reduzir os preços da gasolina e do diesel ou ao menos evitar novas altas, como o projeto de lei que reduz o ICMS cobrado sobre os combustíveis.
“O acionista majoritário é o governo, e se mexe na política e prejudica a Petrobras, os dividendos ficam menores e também prejudicam o governo. A própria política de preços beneficia o caixa federal, é uma equação que obviamente é sabida pelo ministério da Economia”, diz.
Os dois riscos para as ações, de acordo com Conde, seriam o governo não permitir nenhum reajuste nos combustíveis ou a política de preços da empresa mudar após as eleições, como sugerido pelo ex-presidente Lula (PT), candidato no pleito. O segundo risco, porém, está mais distante, e ainda não deve influenciar nas ações.
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