A decisão do presidente — manifestada a interlocutores na semana passada — de entregar voluntariamente o relógio de ouro da marca Cartier dado pela empresa em 2005 também abriria espaço para a devolução de milhares de outras peças.
Ao todo, 9.037 presentes dados entre 2003 e 2010 estão sob responsabilidade do Instituto Lula, conforme levantamento feito pelo Tribunal de Contas da União (TCU) em 2016.
Esses objetos não são de propriedade plena do petista. Trata-se de um acervo privado, mas de interesse público. Todo o material está catalogado, embalado e armazenado.
Entre eles estão itens recebidos de altas autoridades estrangeiras e personalidades nacionais. Por exemplo:
- Espada com punhal em marfim, com detalhes em ouro e diamante, dada pelo monarca saudita Abdullah bin Abdulaziz.
- Broche em ouro amarelo 18k, miniatura do submarino Tikuna, dado pela Marinha do Brasil.
- Fuzil AK-47, fabricado na Coreia do Norte e usado pelas forças da Frente Farabundo Martí de Libertação Nacional (FMLN), dado pelo governo de El Salvador.
- Escultura em madeira e ouro, com foto de Lula na parte central (e de Lula e da então primeira-dama Marisa Letícia na parte posterior), dado por uma família libanesa em 2003.
- Colar em ouro 14k, acomodado em estojo, dado pelo governo do Suriname.
- Caneta tinteiro com pena de ouro 18k, acondicionada em estojo forrado com papel contendo pinturas chinesas e símbolo das Olimpíadas de 2008 na tampa, dada pelo governo da China.
- Duas taças de vinho em estanho, época medieval, dadas pelo então governador de Minas Gerais Aécio Neves. Junto há um bilhete de Aécio: “Caro Presidente e amigo Lula, com meus cumprimentos pelo êxito do primeiro ano, sugiro-lhe um brinde nas taças de estanho de São João del Rei. Sob a inspiração da história e da poesia de Minas. Tenha um Feliz Natal e um grande 2004, extensivos a D. Marisa”.
Decisão do TCU
Na última quarta-feira (7), a maioria dos ministros do TCU liberou Lula de devolver o relógio. Três correntes diferentes se formaram no órgão de controle.
De acordo com a tese vitoriosa, endossada por cinco ministros, não é possível determinar a devolução de presidentes devido à falta de uma norma legal sobre a incorporação dos bens ao patrimônio público.
Segundo aliados de Lula, o entendimento poderia viabilizar uma solução jurídica envolvendo as joias e peças de alto valor recebidas pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) de governos do Oriente Médio.
A Advocacia-Geral da União (AGU) vai recorrer da decisão do tribunal de contas. Para o órgão do governo, deveria ter prevalecido o entendimento de que presentes de caráter “personalíssimo” recebidos por presidentes antes de 2016 não precisam ser incorporados ao patrimônio público.
Esse entendimento está no voto dos ministros Antonio Anastasia e Marcos Bemquerer. Eles defenderam a não devolução do relógio Cartier, mas tendo como base o posicionamento de que as normas não podem retroagir. Apesar da ausência de uma legislação específica, o TCU deliberou em 2016 sobre o tratamento de presentes. Tal entendimento não permitiria rediscutir o caso de Bolsonaro.
Uma terceira linha foi aberta pelo ministro Walton Alencar, que não teve outras adesões. Para Walton, todos os presentes de alto valor recebidos por ex-presidentes durante seus mandatos deveriam ser devolvidos.
Diante do imbróglio em torno do assunto, aliados de Lula defendem que o governo envie um projeto de lei ao Congresso Nacional criando regras para o tratamento de presentes recebidos, conforme informações da âncora da CNN Débora Bergamasco.
A CNN procurou o Instituto Lula e o ex-presidente da instituição Paulo Okamoto, mas não obteve retorno.
Envie seu comentário