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No furor reformista, Câmara muda a Constituição 5 vezes em 60 dias

Texto constitucional perde o caráter de código permanente, e fomenta-se um ambiente de insegurança jurídica permanente, e crescente
Pedro França/Agência Senado

 

Desde fevereiro, na retomada o trabalho legislativo, os deputados somaram 147 horas de votações e debates em plenário.

Nesse período, aprovaram cinco alterações no texto constitucional, em dois turnos de votação.

Significa que realizaram uma mudança na estrutura da Carta a cada 30 horas de reunião plenária.

É recorde. Confirma a aceleração da tendência reformista que fez a Constituição promulgada há 33 anos perder o caráter de código permanente.

Com 114 emendas promulgadas até dezembro passado, foi transformada num periódico.

Já vinha sendo modificada a cada três meses, em média. A Câmara, agora, passou a mudá-la a cada doze dias.

Se o reformismo tem moldado a democracia liberal no Brasil, a fúria reformista está fomentando um ambiente de insegurança jurídica permanente, e crescente.

Ano passado, os senadores aprovaram treze propostas de emendas constitucionais e os deputados outras nove, de acordo com os dados do Congresso.

A mais recente emenda foi feita pela Câmara na semana passada, com o objetivo de anistiar partidos que não obedeceram às leis sobre direitos políticos das mulheres.

Foi a quinta mudança aprovada pelos deputados desde a retomada do trabalho legislativo, em fevereiro.

Eles alteraram o texto constitucional em dois turnos de votação realizados em menos de duas horas, com participação de 506 dos 513 deputados. A maioria votou pelo sistema remoto, adotado desde o início da pandemia.

Praticamente não houve debate, porque normas internas, recém-adotadas, restrigem a discussão aos que estão no plenário.

Além disso, a maioria governista suprimiu, na prática, os prazos regimentais de intervalo de cinco sessões entre os dois turnos de discussão e votação para cada proposta de emenda constitucional.

São raros os dias em que alguém no governo, no Congresso, no Judiciário, nos sindicatos empresariais ou trabalhistas não culpe a Constituição pelo empobrecimento nacional, derivado da estagnação do capitalismo no país.

Esse argumento usual na defesa das “reformas” abstrai uma realidade — o exotismo de 114 emendas constitucionais promulgadas até dezembro passado.

Essa dinâmica reformista é rara no planeta. No Brasil tem resultado numa escalada de conflitos judiciais.

Proliferam as emendas que reformam partes inteiras do texto da Carta, originalmente organizado em 245 artigos do corpo permanente e em 70 disposições transitórias.

Parte das mudanças tem impulso em interesses corporativos. O caso do Judiciário é eloquente: os 226 dispositivos originários, que tratam da organização e do funcionamento desse Poder, já foram modificados mais de 130 vezes desde 1988. Na média, uma mudança a cada 90 dias.

O furor reformista tende a avançar na campanha eleitoral, no debate sobre a instituição de uma variante do parlamentarismo a partir de 2030, e até na proposta de uma nova Constituinte como já é discutido no Partido dos Trabalhadores.

Sobra eloquência de palanque, falta eficácia na aplicação da Constituição que está aí.

 

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