O Ministério Público do Estado do Amazonas (MPAM), por meio da 60ª Promotoria de Justiça Especializada no Controle Externo da Atividade Policial e Segurança Pública (Proceapsp), instaurou três procedimentos para investigar possíveis irregularidades na prisão em flagrante de casal, entre eles uma advogada, detidos com 10 quilos de cocaína. A prisão foi efetuada por policiais militares da Rondas Ostensivas Cândido Mariano (Rocam), mas a atuação da autoridade policial e o procedimento adotado com a soltura de um dos suspeitos levantaram questionamentos da autoridade ministerial.
Um dos pontos investigados refere-se à prática de “flagrantes virtuais” ou “flagrantes de WhatsApp”. De acordo com o promotor de Justiça Armando Gurgel, titular da Proceasp, é comum em Manaus que delegados não compareçam às delegacias ou às cenas do crime para formalizar a prisão em flagrante. Em vez disso, a lavratura ocorre por meio de videoconferência, com o delegado remoto analisando provas exibidas pela equipe policial de plantão.
Essa prática, segundo a promotoria, contraria as diretrizes do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) e do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que defendem a presença física das autoridades como forma de assegurar a qualidade na apuração dos fatos e a proteção dos direitos fundamentais envolvidos.
“O uso da tecnologia é válido quando a presença física não é possível, mas não pode se tornar o padrão institucional”, afirmou o promotor Armando Gurguel. Ele também destacou que a ausência do delegado compromete o processo, incluindo a análise direta de provas materiais e a decisão sobre a necessidade de perícias.
Outro ponto investigado é a justificativa para a soltura da advogada, enquanto o suspeito teve a prisão preventiva decretada. Na audiência de custódia, o juiz plantonista apontou uma “clara discrepância de tratamento” entre os dois detidos, sem justificativa aparente para tal decisão. A advogada, embora estivesse na cena do crime, foi liberada sem a formalização de sua prisão em flagrante, o que levou o MPAM a questionar a conduta do delegado responsável.
A presença de representantes da Comissão de Prerrogativas da Ordem dos Advogados do Brasil – Seccional Amazonas (OAB-AM) na delegacia também é alvo de análise e apuração do Proceapsp. O MPAM ressaltou que a defesa das prerrogativas da advocacia é fundamental, mas destacou a necessidade de equilibrar essa atuação para evitar a impressão de interferência indevida ou favorecimento em casos criminais.
“Não há notícia de violação das prerrogativas da advogada que justifique a atuação massiva da comissão no caso específico. É preciso garantir que todos estejam igualmente submetidos ao império da lei”, afirmou o promotor.
Irregularidades estruturais na segurança pública
Além das questões específicas do caso, o MPAM apontou problemas estruturais na Polícia Civil do Amazonas, como a falta de pessoal e a adoção de procedimentos que, segundo o promotor, comprometem a segurança pública. A ausência de fundamentação formal nas decisões de ratificação ou não de flagrantes por delegados foi outra falha destacada.
“O ato administrativo de confirmar ou negar uma prisão precisa ser fundamentado, garantindo o devido processo legal e a transparência da ação policial. Essa prática, inclusive, já é adotada pela Polícia Federal”, ressaltou o promotor.
Próximos passos
O MPAM seguirá investigando o caso por meio da Proceapsp. Os procedimentos abertos incluem: Análise da legalidade dos flagrantes virtuais e remotos realizados em Manaus; Investigação sobre a conduta do delegado responsável pela soltura da advogada; Avaliação do impacto e da racionalidade na atuação da Comissão de Prerrogativas da OAB-AM.
O caso da prisão da advogada trouxe à tona questões que vão além do crime de tráfico de drogas, envolvendo a eficiência das instituições e o respeito aos direitos e deveres de todos os envolvidos.
Texto: Yasmin Siqueira
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